O depoimento do ex-prefeito de Santa Maria Cezar Schirmer no júri da Kiss contou com duras críticas ao trabalho da Polícia Civil durante a realização do inquérito da tragédia. O inquérito, concluído em 55 dias e com mais de 13 mil páginas, responsabilizou 28 pessoas pelo incêndio, incluindo Schirmer, então prefeito. Durante o depoimento, o atual secretário de município de Porto Alegre chegou a chamar o trabalho de medíocre, insinuou motivações políticas e perseguição da polícia em relação à prefeitura. Em entrevista ao Diário, o delegado Marcelo Arigony, que na época do incêndio era delegado regional e atualmente trabalha na 2ª Delegacia de Polícia de Santa Maria, rebateu as críticas e reafirmou a confiança no trabalho da investigação.
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- O inquérito apontou a prefeitura, apontou bombeiros, pessoas de todas as áreas. Isso é claro. De maneira nenhuma foi direcionado para a prefeitura. A questão é que algumas circunstâncias que foram evidenciadas, no nosso entender, são falhas de fiscalização. E a fiscalização é de parte da prefeitura, sim - afirma Arigony.
Para o delegado, o trabalho foi realizado da melhor maneira possível dentro das condições da época. Ele também negou qualquer interferência política no inquérito.
- Eu nunca fui filiado a partidos, nem quando fui delegado da polícia regional. Fui delegado regional em duas regiões com gestões de dois partidos diferentes e antagônicos, uma em Santiago e outra em Santa Maria - argumenta.
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A investigação começou logo após a tragédia, no dia 27 de janeiro de 2013. Ao final da primeira fase, que durou 55 dias, foram 28 apontamentos e 16 pessoas indiciadas. As conclusões da investigação foram anunciadas em uma coletiva de imprensa no dia 22 de março de 2013, no auditório do Centro de Ciências Rurais (CCR) da UFSM, local simbólico, já que a festa que ocorria na noite do incêndio era organizada por estudantes desse centro. Dos 16 indiciados, restaram apenas quatro que viraram réus e são julgados no Foro Central de Porto Alegre.
- Nosso inquérito não é perfeito. Não tínhamos a pretensão de um inquérito perfeito. Especialmente em um fato dessa magnitude e complexidade. O maior inquérito da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, talvez um dos maiores do mundo. E fizemos isso em menos de dois meses. Se tivéssemos mais tempo e mais condições de trabalho, poderíamos ir mais aos detalhes, e talvez até apontar mais pessoas - disse Arigony.
Uma das críticas de Schirmer ao inquérito é sobre a publicização da investigação. Segundo ele, foi a imprensa que conduziu os trabalhos. A fala também foi rebatida pelo delegado Marcelo Arigony:
- O inquérito policial foi público, sim. O sigilo de um inquérito policial é aquele tanto quanto necessário para preservar as investigações. Nós optamos, desde o início, por publicizar o inquérito policial para ter a imprensa ao nosso lado, exatamente para que não sofrêssemos e não tivéssemos induções políticas no nosso inquérito. A imprensa e a sociedade acompanharam todos os passos, todos os dias. Se tivesse algum fato desses, isso teria vindo a público - afirmou.
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Arigony disse estar triste com as manifestações do ex-prefeito.
- As pessoas costumam olhar o mundo pela sua lente. Quem tem a lente turva para enxergar as coisas ao seu redor, acaba achando que os outros também têm - conclui.
Em uma rede social, o delegado fala que segue trabalhando e cita uma frase de Mano Lima sobre moral:
O delegado Sandro Meinerz, que atualmente é o delegado regional e, na época, também conduziu o inquérito policial, chamou de estapafúrdio o depoimento de Schirmer, e reafirmou que o trabalho conduzido pela Polícia Civil foi imparcial e isento:
- Não existe absolutamente nenhum envolvimento, interesse ou questão política envolvendo o caso. Se trata da maior tragédia do Rio Grande do Sul, em que 242 pessoas foram mortas, é comum as pessoas que são indiciadas e que foram denunciadas e acusadas nos processos, se defendam. E quando fazem a sua defesa, costumam atacar a polícia, como se a polícia tivesse culpa por elas serem responsáveis pelas condutas que elas praticaram. Chama a atenção, no depoimento do ex-prefeito, que ele não foi indiciado, não foi denunciado, ele foi lá como uma mera testemunha. E o depoimento foi muito parecido ao da época, em que nada sabia, precisava ler para poder responder. Assim foi na delegacia de polícia, em que deu depoimento para mim, e não sabia praticamente nada, que não sabia como funcionava, qual era a atribuição dos cargos.
Para Meinerz, as falas de Schirmer em juízo é uma estratégia da defesa para desconstruir o trabalho da Polícia Civil.
- Se ele é uma mera testemunha, acredito que ele estava se defendendo da consciência dele, não de acusações que foram feitas. Foi um depoimento estapafúrdio, ele falou muitas asneiras. Posso dizer isso, porque dizer que o inquérito tem envolvimento político, é completamente descabido. Nós apuramos os fatos, apuramos uma tragédia. Com muita seriedade, preocupação e transparência, com um inquérito completamente público. Ele fez uma defesa de algo que nunca sofreu, ele está se protegendo. É uma distorção de fatos para tentar dizer que são perseguidos - comenta.
Sobre a acusação de que o inquérito foi conduzido pela imprensa, Meinerz rebateu, salientando, novamente, que o serviço dos delegados na época foi acompanhado por diversos setores da sociedade civil:
- O inquérito não foi pautado pela imprensa, mas a imprensa foi fiscal do trabalho, acompanhou toda a nossa investigação, do início ao fim. Assim como o Ministério Público, a AVTSM, a OAB, o Poder Judiciário, advogados de defesa, CREA, sociedade civil organizada, várias instituições, que acabaram sendo determinantes na fiscalização. O trabalho foi feito com bastante imparcialidade e isenção. Infelizmente, naquele contexto, a prefeitura não tomou nenhuma providência para apurar se havia envolvimento de algum servidor.